Causas

Perfil Familiar e Gagueira

Os estudos genéticos direcionados à compreensão dos distúrbios da comunicação humana já vem sendo especificamente desenvolvidos há mais de 20 anos. Segundo Richieri-Costa (2002) a identificação desses distúrbios, como condição única, genética ou ambiental, propiciará estratégias metodológicas (de pesquisas, diagnosticas e terapêuticas) mais precisas para o dimensionamento da expressão e grandeza da linguagem, como condição fundamentalmente humana.

Para Harasty e Hodges (2002) as descobertas de Lai et al. (2001) e Fisher et al. (1998) sobre os genes responsáveis pela linguagem – SPCH1 e do FOXP2 – fornecerão a base para a compreensão da relação entre os traços comportamentais e a base neural na transmissão das desordens de fala e linguagem. Segundo os autores, compreender plenamente a relação entre base neural e déficit lingüístico/cognitivo é a esperança futura para uma terapêutica fundamentada nos genes. Para Harasty e Hodges é a oportunidade para uma abordagem multidisciplinar – pela combinação da análise genética; neuroanatômica e cognitiva – para o avanço na compreensão das desordens desenvolvimentais e degenerativas do sistema nervoso.

Como apresentado por Cox, em 1993, um componente crítico, quase impeditivo nos estudos genéticos da gagueira, tem sido o critério de seleção dos membros afetados e não afetados. Essa consideração ainda é pertinente. Há dez anos atrás não existia e continua não existindo um consenso sobre a definição de gagueira; sobre a existência ou não de sub-tipos da doença; sobre uma possível etiologia de diferenciação entre a gagueira recuperada ou persistente. Como considerado por Cox bom seria se a herança fosse mendeliana mas a gagueira se distribui de forma ainda não suficientemente compreendida: número significante de famílias onde, além do probando, ninguém mais é afetado; famílias com muitos afetados; numerosas pesquisas onde o critério de inclusão dos probandos não foi objetivo (análise de segregação baseada em questionários informativos).

Nos EUA vem sendo realizado um projeto de grande dimensão intitulado NHI Family Research Project on Stuttering que envolve diferentes grupos de pesquisadores entre eles Drayna; Yairi; Ambrose; Cox; Stager e Kelly. A definição de gagueira adotada pelo grupo é de tratar-se de uma desordem da comunicação caracterizada por rupturas involuntárias do fluxo suave da fala, sendo a gagueira desenvolvimental aquela que surge no período de aquisição e desenvolvimento da fala/linguagem, cuja incidência é 4 e a prevalência é 1, predominante no sexo masculino numa razão de 3.8/1, sendo que em 53% dos casos existe um histórico familiar positivo para a desordem (Yairi, Ambrose, 1992a/b; Yairi, Ambrose, Cox, 1996; Drayna, Kilshaw e Kelly, 1999; Andrade, 1999 e 2000).

Para Drayna (2000 e 2001) a fase atual do NHI Family Research Project on Stuttering está vinculada à busca de marcadores genéticos (estudo de linkages, co-hereditariedade) em famílias com gagueira. Isso se justifica porque quando o marcador ou marcadores mostram uma co-herança é sabido que se está perto do gene (s) que causam a gagueira naquelas famílias. Desde que seja conhecido o local de cada marcador testado descobre-se o elo entre o marcador e a localização do gene envolvido, podendo-se descobrir a contribuição de cada um desses genes para a gagueira. O gene uma vez localizado pode ser isolado. Qualquer elemento que mostre diferenças hereditárias é um marcador genético. Encontrar o(os) gene(s) que possa(m) causar a gagueira possibilitará que seja pesquisada sua influência para indivíduos fluentes, disfluentes e gagos.

Num estudo de Fesenfeld et al. (2000) os autores consideram que a gagueira desenvolvimental seria a fratura e rompimento da seqüência motora da palavra, sentida pelo falante como uma perda de controle temporário sobre os movimentos da musculatura envolvida na fala. A conseqüência da gagueira seria o desencadear de respostas reativas (evitação, ansiedade, pânico social, etc.), nos casos persistentes, constituindo a síndrome clínica. Para os autores, dentre os riscos de morbidade, os fatores genéticos parecem ser uma importante expressão da condição. No estudo iniciado, tanto o modelo de locus major isolado com transmissão sexo modificada quanto o modelo de limiar poligênico multifatorial tem sido testados.

* Claudia Regina Furquim de Andrade Professora Titular Laboratório de Fluência, Motricidade e Funções Orofaciais Fonoaudiologia, Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo