Tratamentos
Intervenção Fonoaudiológica na Gagueira: Considerações Gerais
De 16 a 22 de outubro de 2005
Gagueira é um distúrbio da fala que tem como principais manifestações as disfluências, ocasionando interrupções e reduzindo o fluxo de informação. Além das disfluências podem ocorrer os concomitantes físicos. A gravidade da gagueira pode variar de um quadro leve a muito grave, de acordo com a freqüência de rupturas na fala, com o tempo médio gasto nas disfluências, bem como com a presença de concomitantes físicos. A qualidade de vida do indivíduo que gagueja poderá ser prejudicada dependendo da gravidade do distúrbio e a forma de aceitação da gagueira por parte do próprio indivíduo e dos ouvintes.
Existem dois tipos de gagueira: a desenvolvimental e a adquirida. A gagueira adquirida é mais rara e pode estar associada a eventos psicológicos (psicogênicas) ou neurológicos (neurogênicas), podendo ter início em qualquer fase da vida.
A gagueira desenvolvimental, por sua vez, ocorre com maior prevalência e inicia-se na infância, podendo ter como causa fatores hereditários ou estar relacionada a outros eventos, como por exemplo, fatores estressantes físicos e/ou emocionais. Aproximadamente metade dos casos de gagueira desenvolvimental é familial ou hereditária (tem algum outro familiar que também apresenta gagueira).
A taquifemia, distúrbio da fala que apresenta fluxo de palavras aumentado com disfluências típicas ou comuns excessivas, também pode ser considerada como um antecedente familial positivo para gagueira, já que estes distúrbios podem ocorrer num mesmo indivíduo ou numa mesma família. Portanto, gagueira e taquifemia podem ter a mesma base genética.
Acredito que apenas um fator isolado não justifica a gagueira, mas sim vários fatores, por isso o modelo multifatorial poligênico é o mais coerente com o distúrbio. Deve existir em muitos casos uma predisposição orgânica para gagueira, que junto com fatores ambientais, por exemplo, podem justificar o surgimento do distúrbio.
A prevalência da gagueira é maior na infância e reduz na fase adulta. Quanto à razão sexual, este distúrbio tem maior predominância no sexo masculino, sendo que o sexo feminino apresenta maior possibilidade de recuperação da gagueira.
A intervenção fonoaudiológica varia de acordo com a idade do indivíduo gago e o grau de risco apresentado. Nos casos infantis é necessário realizar um diagnóstico cauteloso visando identificar o risco apresentado por esta criança para desenvolver uma gagueira crônica. Quando o risco for baixo, indica-se a realização do trabalho familiar, na qual o fonoaudiólogo deve orientar os familiares para promover um ambiente que favoreça a fluência da criança. Neste processo várias estratégias são utilizadas no sentido de preparar os familiares para promoverem a fluência na criança, como orientações verbais, distribuição e leitura de folhetos explicativos, oferecimento de modelos, interações do terapeuta com a criança e os familiares, treinamento, entre outras.
Quando o diagnóstico fonoaudiológico confirmar o quadro de gagueira, indica-se a realização de terapia fonoaudiológica com a criança e orientações familiares. O trabalho com a criança visa promover uma fala fluente, e para tanto pode ser trabalhado com estratégias lúdicas e jogos, levando-se em conta a idade cronológica. A abordagem de modelagem pode ser utilizada visando estabelecer uma fala mais suave e com um número reduzido de inícios (“phrasing”).
Nos adultos a modelagem também pode ser utilizada ou a abordagem integrada de acordo com a necessidade de cada paciente. È importante considerar a naturalidade da fala, que precisa ser mantida para que o paciente use este modelo de fala fora da terapia e consiga transferir e manter a fluência.
Quanto ao tempo de duração da terapia é variável de acordo com a idade, gravidade da gagueira, entre outros fatores. Em média com 15 semanas já é possível reduzir no mínimo um grau de gravidade da gagueira. O tempo de terapia pode variar de 4 meses a 2 anos.
Para finalizar, vale ressaltar que o fonoaudiólogo que trabalha com gagueira deve considerar as diversas possibilidades do resultado terapêutico: fluência espontânea, fluência controlada e gagueira aceitável. As variáveis que irão ajudar a clarear o prognóstico são a idade do paciente, o tempo de persistência do quadro, a presença ou não de fatores hereditários, a persistência ou não da gagueira nos familiares, entre outras.
Cristiane Moço Canhetti de Oliveira é fonoaudióloga (CRF 5301/SP), doutora pelo Instituto de Biociências – área de Genética – UNESP – Botucatu e professora do Departamento de Fonoaudiologia – UNESP – Marília.