Gagueira Infantil

Orientações à família da criança que gagueja

A gagueira na infância tem de 98% a 100% de chances de ser eliminada1 desde que adequadamente detectada e competentemente tratada. Esse é, basicamente, o tema da campanha do DIAG de 2007. O que significa “adequadamente detectada”? Significa que as pessoas que interagem com a criança, do seu pediatra ao seu professor de pré-escola, além de seus pais e familiares, devem estar atentas ao desenvolvimento da fala e da linguagem da criança. É comum as crianças apresentarem disfluências entre os dois e os quatro anos2,3. Essas disfluências tendem a desaparecer em três meses4 . Se a criança continua falando com repetições de sílabas e palavras pequenas, prolongando sons em demasia ou ainda, travando no início de uma fala, procure um fonoaudiólogo especializado em distúrbios de fluência.

O que significa “competentemente tratada”? Significa que o fonoaudiólogo a ser procurado precisa demonstrar conhecer profundamente o assunto. Como em qualquer profissão, a vastidão de conhecimentos sobre uma área leva os profissionais à especialização. Quem se dedica à área da fluência e seus distúrbios, não foge à regra. Há uma quantidade de competências e habilidades que são desenvolvidas para qualificar o fazer fonoaudiológico em cada uma das áreas5, inclusive esta que é o motivo do DIAG.

Assim, chegamos à primeira orientação:

1. OUÇA A FALA DE SUA CRIANÇA COM ATENÇÃO. Não pressuponha que a gagueira esteja acontecendo porque houve um susto, ou porque nasceu (ou faleceu) alguém, ou porque levou um tombo e bateu a cabeça, entre tantas alternativas. As causas da gagueira ainda não são conhecidas plenamente. Porém, já se sabe com bastante certeza, que eventuais problemas emocionais são conseqüência de uma fala gaguejada, não tratada em tempo hábil de ser revertida2,3. Por isso, a segunda orientação tem a ver com a presteza com que você vai agir.

2. NÃO ESPERE. Aprender a falar é muito complicado. Não pense que sua criança ainda é tão pequena, que isso vai passar… Gagueira que durar mais de três meses precisa ser avaliada pelo fonoaudiólogo especialista e, se for o caso, tratada. A prevenção é a melhor forma de se impedir que uma gagueira fique crônica2. Ainda não podemos impedir que uma criança comece a gaguejar, especialmente se há outras pessoas que também gaguejam na mesma família. Mas podemos impedir que esta criança se torne um adulto que gagueja. Podemos colaborar para que tenha falas fluentes6,7.

3. O QUE VOCÊ, que nos honra com sua participação neste Fórum, e é pai, mãe, professor, ou interessado no assunto, PODE FAZER PARA MELHORAR A FALA DE UMA CRIANÇA QUE GAGUEJA?3,4,5

3.a Mostrar ao invés de mandar fazer é muito mais eficiente. Se quiser que a criança fale mais devagar, por exemplo, então fale você mais devagar com ela. Isto vai lhe permitir entender o que lhe é solicitado. Seja um bom modelo de fala para a criança.

3.b Falar com ao invés de falar para. Significa ouvir mais e mandar menos, ter tolerância, promover experiências agradáveis de fala, auxiliar a criança a expressar seus sentimentos.

3.c Usar a comunicação não-verbal. Expressar apoio, usar padrão vocal afetuoso, ter proximidade, demonstrar afeto e compreensão. Tocar a criança, acolhê-la.

3.d Diminuir a pressão do tempo na comunicação. Falar mais devagar com a criança, dar-lhe tempo, não interromper. Falar com a criança na mesma altura dela. Abaixe-se, ou traga-a para a altura de seus olhos. Assim ela não precisará ficar olhando para cima, tensionando o pescoço.

3.e Aceitar a criança que gagueja. Procurar entender as diferenças individuais da fala, aumentar a tolerância, expressar aceitação, descrever os comportamentos ao invés de rotulá-los. Conversar com a criança a respeito da “boca que às vezes tranca”, “da fala que às vezes parece difícil”, orientando-a direta e calmamente, evitar dizer “pare”, “respira”, “fala devagar”, nem pedir para parar e começar de novo. Tentar reduzir os medos e as frustrações com a fala gaguejada para mostrar à criança como lidar com estes sentimentos.

4. EVITAR A “CONSPIRAÇÃO DO SILÊNCIO”8. Falar com seus familiares sobre a gagueira, sobre como é importante respeitar a criança que não quer ser centro de atenções, a necessidade de que a escola e os professores estejam orientados para manejos em sala de aula e em momentos de tensão, como a hora da novidade ou da leitura.

5. Para tanto, é preciso ATUALIZAR E MAPEAR CONHECIMENTOS que permitam maior precisão na sua busca de solução para a gagueira de sua criança. Acima de tudo, faça com que ela sinta a sua importância no meio onde está, apesar de sua gagueira. Se ela conseguir pensar “Gaguejo sim, e daí?”, os caminhos ficarão mais fáceis.

Anelise Junqueira Bohnen: Mestre em Fonoaudiologia pelo Ithaca College, USA. Especialista pela Fundação Americana de Gagueira (SFA) e Northwestern University. Doutoranda do Instituto de Letras da UFRGS. Presidente do Instituto Fala & Fluência. Autora do livro Sobre a Gagueira.

1. CONTURE EG. Treatment efficacy: stuttering. Journal of Speech and Hearing Research, 1996; 39:S18-S26.
2. BOHNEN, AJ Sobre a Gagueira. Unisinos: São Leopoldo, 2005.
3. BOHNEN, A. J. . Fazendo terapia para crianças que gaguejam e orientando suas famílias.. In: MAIA RIBEIRO, Ignes. (Org.). Conhecimentos essenciais para atender bem a pessoa com gagueira. 2a ed. São José dos Campos: Pulso Editorial, 2005.
4. BOHNEN, AJ Avaliando crianças com gagueira. In: MAIA RIBEIRO, I. Conhecimentos essenciais para atender bem a pessoa com gagueira. 2ª ed.Pulso Editorial, São José dos Campos, 2005.
5. BOHNEN, AJ Neurociências e o fonoaudiólogo especialista em gagueira. Fórum Científico do Instituto Brasileiro de Fluência e Universidade Federal do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2007. http://www.gagueira.org.br/
6. RIBEIRO, IM Gagueira: tratamento fonoaudiológico. Fórum Científico do Instituto Brasileiro de Fluência e Universidade Federal do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2007. http://www.gagueira.org.br/
7. OLIVEIRA, CC Terapia fonoaudiológica da Taquifemia. Fórum Científico do Instituto Brasileiro de Fluência e Universidade Federal do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2007. http://www.gagueira.org.br/
8. VAN RIPER, C.; EMERICK, L. Correção da Linguagem. 8.ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.