NOTÍCIAS

Perspectivas sobre a gagueira e o olhar da pessoa que gagueja


Por Redação SRzd

Você conhece alguma pessoa que gagueja? Você já fez “piada de gago” ou já chamou alguém de “gaguinho”? Possivelmente já fez isso, mas nunca parou para pensar sobre todo o universo que existe em torno da gagueira e o quanto ser pessoa que gagueja causa angústia e sofrimento a quem tem esse distúrbio da comunicação.

Sim! Gagueira causa muito sofrimento. É angustiante, dói no peito quando é difícil pronunciar o próprio nome ou é uma tortura pedir um lanche na rua ou constrangedor observar a impaciência ou o deboche de quem te escuta.

A gagueira é um distúrbio da fluência reconhecida há muitas décadas, não só por acadêmicos que estudam a fala como também pela sociedade em geral, como mostra o filme “O Discurso do Rei”, ganhador do Oscar de melhor filme em 2011. Nele acompanhamos a história de George VI, Rei da Inglaterra entre os anos 1936 e 1952, na sua caminhada para lidar com a gagueira já na fase adulta uma vez que se vê obrigado a assumir o trono após o falecimento de seu pai e a renúncia do natural sucessor.

Como pôde-se ver pelos tratamentos apresentados no filme, as abordagens das terapias atuais avançaram muito desde os anos 1930. Porém, enquanto o conhecimento acadêmico em relação às causas e tratamentos da gagueira evoluíram com o tempo, o conhecimento da sociedade em geral continua muito parecido com o apresentado pelo filme.

Hoje em dia, um dos grandes inimigos das pessoas que gaguejam é a falta de conhecimento observado nos indivíduos que nunca tiveram contato com esse distúrbio. A ignorância sobre um assunto costuma gerar questionamentos e estimula a imaginação, esta última facilmente origina as falsas verdades comumente propagadas sobre a gagueira.

As muitas inverdades ditas a respeito da gagueira e da pessoa que gagueja se referem a supostas causas da gagueira (insegurança, nervosismo, um susto tomado quando criança), possíveis curas (bater com uma colher de pau na cabeça do indivíduo que gagueja por exemplo) ou suposições sobre as pessoas que gaguejam (são incapazes intelectualmente). Tudo isso fere e faz sofrer a pessoa que gagueja, minando buscas por tratamento, sua autoestima e fechando oportunidades no mercado de trabalho para as pessoas que gaguejam adultas.

Os desafios para conquista de espaços no mercado de trabalho se torna uma luta para pessoa que gagueja, principalmente os que envolvem a comunicação direta com o público. Essa comunicação que envolve três partes importantes: emissor, mensagem e o ouvinte, pode não ser efetiva no momento da entrevista de emprego, onde principalmente o ouvinte pode desconhecer sobre a gagueira e não levar em conta todo conhecimento da mensagem que está sendo passada pela pessoa que gagueja.

A grande pergunta que uma pessoa que gagueja pode fazer diante da sociedade é como encontrar apoio. A resposta pode ser encontrada na construção constante de redes de apoio na sociedade, estudos sobre a comprovação da neurofisiologia da gagueira revelando o aspecto involuntário e individual, retirando a causa emocional que por muitos anos se acreditava e que ainda precisa ser combatida em falas do nosso dia-a-dia.

Compreender também que a gagueira acontece apenas no sistema pré-motor da fala espontânea, ou seja, antes de enviar os comandos para executar motoramente a fala onde a pessoa que gagueja já sabe a palavra que vai apresentar a disfluência e precisa de tempo para dar continuidade a sua fala. Esse aspecto pode ampliar a visão do ouvinte para saber esperar o tempo de fala de cada pessoa que gagueja, além de contribuir para tratamentos fonoaudilógicos mais efetivos, criando assim mais respeito e apoio.

Esse apoio que é necessário para 10 milhões de pessoas estão gaguejando agora no Brasil, na proporção de 2 homens para 1 mulher. A alta incidência precisa ser levada em conta e alimentar mais atualizações, estudos, políticas públicas e compreensão sobre a gagueira e pessoa que gagueja.

A principal rede de apoio foi criada em 2004, a Associação Brasileira de Gagueira – Abragagueira se dedica a defesa e a valorização da pessoa que gagueja em todo o Brasil, oferecendo conhecimento para a desmistificação da gagueira e da pessoa que gagueja (acabar com mitos do tipo “a pessoa que gagueja é insegura” ou “a pessoa que gagueja é incapaz”).

Os grupos de apoio para pessoas que gaguejam estão espalhados em dezenas de cidades do Brasil, criando um foro de discussão sobre o tema e, acima de tudo, para que a pessoa que gagueja sinta-se acolhida e à vontade para compartilhar as suas experiências, vitórias e desafios.

Convidamos todos a conhecer o trabalho da Associação Brasileira de Gagueira em www.abragagueira.org.br e em nossas redes sociais. No próximo dia 22 de outubro é celebrado o Dia Internacional de Atenção a Gagueira, data na qual e durante todo o mês de outubro atividades são desenvolvidas em todo o mundo em prol da conscientização sobre a gagueira e a pessoa que gagueja. No dia 24 de outubro, a Abragagueira realizará o I Encontro Brasileiro Online de Pessoas que Gaguejam.

Gagueira não tem graça, tem tratamento! A pessoa que gagueja pode ser o que quiser em sua vida!

* Artigo de autoria de Carolina Ferreira da Costa Leite – Fonoaudióloga CRF 1-15538 – comoderadora do Grupo de Apoio para Pessoas que Gaguejam de Niterói/Victor Fonseca – pessoa que gagueja, moderador do Grupo de Apoio para Pessoas que Gaguejam de Niterói e engenheiro/Luiz Fernando de Souza Barreto Ramos Ferreira – pessoa que gagueja presidente da Associação Brasileira de Gagueira e advogado.

Ref.

ANDRADE, Claudia Regina Furquim de et al.Autopercepção da pessoa que gagueja quanto à avaliação de suas experiências e dos resultados de seu(s) tratamento(s) para a gagueira.2014 Oliveira e Bohnen, 2016. Andrade, 2017.